JORNAL DO COMÉRCIO 21/10/2013
Heinze quer mudanças no processo de demarcação de terras
Fernanda Bastos
MARCO QUINTANA/JC
“Haverá um novo rito demarcatório tirando os superpoderes que a Funai tem”
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado federal Luis Carlos Heinze (PP), está mobilizado para modificar as etapas do processo de demarcação de terras para os indígenas. Heinze sustenta que a Funai concentra poder de decisão exagerado sobre as demandas em detrimento dos produtores.
Liderança da chamada bancada ruralista - que está em constante embate com os parlamentares com trajetória de apoio aos direitos humanos -, Heinze critica o governo federal e sustenta que o Executivo estimula a guerra entre donos de terra e o povo indígena por não se responsabilizar por pagar pelas propriedades para as quais a Funai determina expropriações. Amanhã, ele se reúne com o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para pressionar por mudanças no processo.
O progressista ainda sustenta que os relatórios que embasam as demarcações de terras são ideológicos e que produzem injustiças contra os fazendeiros. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, ele ainda minimiza reclamações de entidades que denunciam abusos e violência contra indígenas e rebate que são os agricultores que hoje estão em situação de risco. O deputado também avalia o cenário eleitoral no Estado e no País.
Jornal do Comércio – Qual é a principal pauta da FPA atualmente?
Luis Carlos Heinze – A questão principal é tirar a ideologia desse processo. Quando o assunto vem com qualquer ideologia, como aconteceu em 2003 quando o presidente Lula (PT) assumiu a Funai e montou um “bunker” junto com um setor da igreja católica, ONGs de antropólogos e também ONGs internacionais. Os antropólogos, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Funai traçaram uma estratégia para o Brasil - não só para o Rio Grande do Sul. E erraram na forma como eles conduziram o processo. Tem gente em cima das terras, não são invasores. A mesma coisa seria se alguém invadisse a casa ou o apartamento de outra pessoa. Se tenho uma propriedade, como é que vou perder? Eles não deram bola para isso, e o erro está aí. O foco maior está nessa armação. No Rio Grande do Sul, hoje catalogamos 30 processos de expropriação de terras. Começamos a receber demanda do pessoal que vota em mim. Mas a gente não conseguia focar. Quando nos elegemos em 2011, disse à senadora Ana Amélia Lemos (PP) para fazer uma reunião com a Assembleia, a Câmara dos Deputados e o Senado. Daí saiu a primeira mobilização, com muita repercussão, e aí começaram a se juntar outros deputados pelo Brasil. Hoje, temos 16 estados com problemas sérios, iguais aos que temos aqui, como Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul. Então, temos que mudar essas regras. No Brasil, há quase 500 processos em andamento hoje, e todos do mesmo jeito. O que preocupa é a forma como eles fizeram, inclusive com setores do Ministério Público Federal (MPF) se manifestando a favor. Mas tem famílias, gente do outro lado. Esse é o problema.
JC – O grupo de trabalho da Câmara sobre o tema apontou como saída para o impasse uma indenização aos afetados pelas demarcações. A apresentação do relatório não foi acompanhada pela bancada ruralista, que não concordou com os encaminhamentos do GT. A indenização não seria uma alternativa satisfatória?
Heinze – Tem que haver um pagamento, e explico por quê. Na Constituição de 1988, foi determinado que o Brasil teria um prazo para demarcar terras indígenas até 1993 - cinco anos depois da Constituição. Estamos em 2013 e não foi resolvido. Sou a favor que se pague, agora, o negócio é o seguinte, se o governo federal quer fazer política, que pague. Mas só aqui no Estado hoje, se o governo federal quisesse implementar, daria R$ 6 bilhões. Para todo o Brasil, quase R$ 50 bilhões. O Brasil tem isso? Não tem saúde, não tem educação, não tem estrada, não tem ferrovia. Eu não sou contra os índios, só quero saber se eles têm dinheiro para isso. E está certo tirar gente que trabalha? Pegamos escritura de 1876, de imigrantes alemães, italianos. Os caras compraram as terras deles, não expulsaram ninguém. E era para colonizar, hoje dizemos: “Vai embora daqui”, para gente que nasceu aqui, muitas gerações. Os índios, na época, não sei se havia mil na região do Rio Grande do Sul, hoje tem 23 mil índios. Fraudulentamente eles montaram esse processo. Assim é em Mato Preto (nos municípios de Getúlio Vargas, Erebango e Erechim), e assim é nos 30 processos. Tudo que eles fizeram foi mais ou menos esquematizado. É com isso que não concordo. Quer comprar 100 mil hectares de terra? Se o Estado tem dinheiro, que compre, não tem problema. Mas não faça isso de montar processos fraudulentos.
JC – Isso estimula os conflitos?
Heinze – Lógico, porque foi estimulado, eles traçaram uma estratégia. Agora um laudo anula tudo. E qual é o cara que investe se não tenho segurança jurídica alguma? Dilma fala que o Brasil pode investir, daí vem construir uma hidrelétrica em Belo Monte, onde não tinha índio. Fizeram um levantamento com as pessoas, daí trouxeram índios e colocaram tudo lá em cima. Tudo é montado, o erro esta aí. Não é de terra que eles precisam, é de dar condições para que produzam. Dos 23 mil, são 100 índios. O resto são lideranças deles, não aparecem. Eles também são vítimas desse processo. Eles estimularam 30 processos no Rio Grande do Sul. Tem 23 mil índios, eles criaram essa fantasia. Eles quem? Funai, ONGs. Por que os antropólogos estão aqui? Porque eles arrumaram emprego para eles. Tem mais de mil processos de quilombolas aqui. Mas 90% do pessoal pensam desse jeito: que um laudo vale uma escritura, aí eles fraudam. Qual o lugar em que não há vestígio de índio que posso dizer? Qualquer lugar do Brasil. Um dia alguém morou, tudo bem. Mas só isso não serve.
JC – Como analisa essa suspensão da tramitação da PEC 215, que possibilitaria que o Legislativo seja responsável pela homologação das demarcações, hoje feitas pelo Executivo.
Heinze – Uma das razões é ideologia. No momento em que suspendemos na semana passada, quando teve uma reunião com José Eduardo Cardoso e o procurador-geral da República, se resolveu discutir duas coisas. Eles nos prometeram apresentar um decreto. A (ministra chefe da Casa Civil) Gleisi (Hoffmann, PT) prometeu em abril que colocaria no processo a Embrapa, o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário). É o que eles vão nos apresentar, uma portaria, um novo rito demarcatório tirando os superpoderes que a Funai tem hoje. A Funai é o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, faz tudo. Daí tem dois, três, cinco anos para fazer um processo, mas a pessoa tem 90 dias para fazer sua defesa. Então, se vê que é um pouco ideológico.
JC – Os críticos da PEC dizem que o Congresso privilegiaria os ruralistas, já que têm mais representação que os indígenas.
Heinze – Se era para delimitar até 1993 e estamos em 2013, até quando vai? Do jeito deles, que não tem que pagar nada, e eles querem 20 milhões a 30 milhões de hectares a mais, vai terminar quando? O que eles dizem é o seguinte: “São 3% do Brasil”. Dá 24 milhões ou 25 milhões de hectares. Já tem 14% em terra indígena.
JC - Como fica a pauta da FPA com a suspensão da análise da PEC?
Heinze - O que priorizamos hoje é a votação do Projeto de Lei 227, que ele trata da regulamentação do artigo 231, que ele coloca isso aqui, que daqui para frente o Estado faça. Pronto. Agora, anula esse processo. “Ah, os processos que já estão andando ficam”. Ficam nada. Tudo que está errado tem que sair daqui. Quero respeitar o marco temporal de 1988. O trâmite está emperrado, porque o governo não quer. E quando ele não quer, não vai. O governo tranca desde abril, maio. Sabe quem pediu pra fazer esse projeto? O Ministério da Justiça, e agora estão emperrando. Na reunião, vamos discutir isso. O negócio é o seguinte: temos que regulamentar esse artigo e só tem um jeito de fazer; basicamente, temos que votar o tal do marco temporal e acabou, não posso deixar, tem mais de 100 famílias com problemas no Brasil. Quantas mortes de índio e de branco teve em cima desse assunto? Não dá. Tem que pôr um fim.
JC – Esse trâmite, na sua avaliação, traz prejuízos para a economia brasileira?
Heinze – Mas é lógico. Esse pessoal planta trigo, soja, tira leite, planta qualquer coisinha ali. No Maranhão, 5 mil pessoas estão para serem expulsas de uma cidadezinha por essa questão indígena. Lá tem dívida do Brasil com a Venezuela, se saem as famílias, terminam a cidade. Está certo isso? A maioria da cidade é de índios, mas porque a lei é assim, tem que fazer.
JC – Por outro lado, as entidades ligadas aos indígenas apontam que muitos processos dos supostos proprietários das terras é que teriam sido fraudados.
Heinze – A Embrapa hoje tem mecanismos que remontam aos anos 1950. Mas vamos pegar a Constituição de 1988. Quem estava em cima da terra em 1988, que foi o marco?
JC – Há denúncias de pressão e agressão para tirar indígenas das terras...
Heinze – Violência tem aqui. Os índios ameaçando os produtores, fizeram isso em Mato Preto, tiraram gente em Sananduva, 7 hectares invadidos. O presidente da associação de lá disse que eles não quiseram enfrentar, tiveram medo.
JC – A FPA diz que há violência dos indígenas, e eles, por sua vez, denunciam violência por parte dos produtores. Há como conciliar essas duas versões?
Heinze – Mas não são duas verdades, a verdade é uma só. O artigo 231 fala em áreas tradicionalmente ocupadas, mas eles começam a desenvolver uma tese que pode ser de quando o Brasil foi descoberto. A verdade é uma só: eles que distorcem a verdade. O que quer dizer a Constituição de 1988 é “quem está ocupando a terra”. O Supremo julgou nesse termo. Espero que mantenham quinta-feira no julgamento dos embargos da Raposa-Serra do Sol (em Roraima).
JC – O senhor afirma que há injustiça no processo. Mas e a reparação histórica aos indígenas? A bancada ruralista é acusada de dar primazia a interesses econômicos.
Heinze – Não é um problema. Não tenho que reparar nada. Por que 7 mil famílias do Rio Grande do Sul têm que pagar? Temos 11 milhões de habitantes, por que 7 mil foram crucificados? Foram escolhidos? Há suicídio, depressão, mortes.
JC – O senhor vê alguma possibilidade de consenso?
Heinze – Negociação. Os laudos têm que ser sepultados. Para mim, são fraudulentos. E o governo tem que comprar os hectares.
JC – Com relação às eleições de 2014, como avalia a conjuntura para o lançamento da candidatura própria do PP com a senadora Ana Amélia Lemos?
Heinze – Tenho falado muito com vereadores, lideranças do PMDB, que têm comentado que gostariam dessa aliança. A gente tem uma ligação muito boa. A ideia mais fixa é eles terem candidato. O que estamos trabalhando hoje é que seria uma chapa ideal se fosse José (Ivo) Sartori com Ana Amélia.
JC – PP ou PMDB estão dispostos a abrir mão da cabeça de chapa?
Heinze – É difícil. Ana já está na posição que está nas pesquisas, que mostraram que ela está lá em cima. O PMDB tem uma condição firme de ter um candidato, e o PDT tem a candidatura do (deputado federal) Vieira (da Cunha), e ele venceu dentro do partido. É importante isso. Eles têm um belo candidato ao Senado, o Lasier (Martins). Mas, em política, nada é impossível.
JC – O PP integrar o governo Dilma Rousseff (PT) atrapalha uma candidatura de oposição ao governo Tarso?
Heinze – Negativo. No Rio Grande do Sul e em outros estados, a gente sempre busca a independência. O partido dificilmente fecha questão de Norte a Sul. Existe gente que quer apoiar Dilma, gente que queria apoiar Eduardo (Campos, PSB) e que quer apoiar Aécio (Neves, PSDB), que é meu caso. Hoje, em função da Ana Amélia, por causa do tempo de TV, muita gente quer vender o tempo, e somos bem claros que isso tem que ser discutido com o partido. Vai ter quem apoie Aécio, mas pode não ser essa a decisão do partido em nível estadual. Tinha o apoio a Campos, que complicou com a Marina, pelas posições que ela tem tomado. Há um ranço com o (deputado federal Ronaldo) Caiado (DEM-GO), há comigo. São as mesmas posições.
Perfil
Luis Carlos Heinze é natural de Candelária. Migrou para Alegrete na adolescência, onde completou o ginásio agrícola, atuando como técnico-agrícola. No município, também participava do grêmio estudantil, onde iniciou sua atividade política, ainda que sem filiação a partido. Já em Santa Maria, nos anos 1970, graduou-se em Agronomia pela UFSM. Na universidade, presidiu o centro acadêmico do curso. Estabeleceu-se em São Borja em 1973, criando um escritório de planejamento e assessoramento a produtores. Ali iniciaria sua ligação com o movimento ruralista, especialmente com os arrozeiros. Foi secretário municipal da Agricultura de São Borja de 1991 até 1992, quando disputou a prefeitura do município. Venceu e comandou o Executivo até 1996. Disputou e conquistou uma cadeira na Câmara dos Deputados no pleito de 1998. Desde então, busca a reeleição, estando no quarto mandato. No ano que vem, pretende concorrer para manter o espaço na Câmara novamente. Tem 63 anos.
Heinze quer mudanças no processo de demarcação de terras
Fernanda Bastos
MARCO QUINTANA/JC
“Haverá um novo rito demarcatório tirando os superpoderes que a Funai tem”
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado federal Luis Carlos Heinze (PP), está mobilizado para modificar as etapas do processo de demarcação de terras para os indígenas. Heinze sustenta que a Funai concentra poder de decisão exagerado sobre as demandas em detrimento dos produtores.
Liderança da chamada bancada ruralista - que está em constante embate com os parlamentares com trajetória de apoio aos direitos humanos -, Heinze critica o governo federal e sustenta que o Executivo estimula a guerra entre donos de terra e o povo indígena por não se responsabilizar por pagar pelas propriedades para as quais a Funai determina expropriações. Amanhã, ele se reúne com o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (PT), e o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para pressionar por mudanças no processo.
O progressista ainda sustenta que os relatórios que embasam as demarcações de terras são ideológicos e que produzem injustiças contra os fazendeiros. Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, ele ainda minimiza reclamações de entidades que denunciam abusos e violência contra indígenas e rebate que são os agricultores que hoje estão em situação de risco. O deputado também avalia o cenário eleitoral no Estado e no País.
Jornal do Comércio – Qual é a principal pauta da FPA atualmente?
Luis Carlos Heinze – A questão principal é tirar a ideologia desse processo. Quando o assunto vem com qualquer ideologia, como aconteceu em 2003 quando o presidente Lula (PT) assumiu a Funai e montou um “bunker” junto com um setor da igreja católica, ONGs de antropólogos e também ONGs internacionais. Os antropólogos, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Funai traçaram uma estratégia para o Brasil - não só para o Rio Grande do Sul. E erraram na forma como eles conduziram o processo. Tem gente em cima das terras, não são invasores. A mesma coisa seria se alguém invadisse a casa ou o apartamento de outra pessoa. Se tenho uma propriedade, como é que vou perder? Eles não deram bola para isso, e o erro está aí. O foco maior está nessa armação. No Rio Grande do Sul, hoje catalogamos 30 processos de expropriação de terras. Começamos a receber demanda do pessoal que vota em mim. Mas a gente não conseguia focar. Quando nos elegemos em 2011, disse à senadora Ana Amélia Lemos (PP) para fazer uma reunião com a Assembleia, a Câmara dos Deputados e o Senado. Daí saiu a primeira mobilização, com muita repercussão, e aí começaram a se juntar outros deputados pelo Brasil. Hoje, temos 16 estados com problemas sérios, iguais aos que temos aqui, como Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul. Então, temos que mudar essas regras. No Brasil, há quase 500 processos em andamento hoje, e todos do mesmo jeito. O que preocupa é a forma como eles fizeram, inclusive com setores do Ministério Público Federal (MPF) se manifestando a favor. Mas tem famílias, gente do outro lado. Esse é o problema.
JC – O grupo de trabalho da Câmara sobre o tema apontou como saída para o impasse uma indenização aos afetados pelas demarcações. A apresentação do relatório não foi acompanhada pela bancada ruralista, que não concordou com os encaminhamentos do GT. A indenização não seria uma alternativa satisfatória?
Heinze – Tem que haver um pagamento, e explico por quê. Na Constituição de 1988, foi determinado que o Brasil teria um prazo para demarcar terras indígenas até 1993 - cinco anos depois da Constituição. Estamos em 2013 e não foi resolvido. Sou a favor que se pague, agora, o negócio é o seguinte, se o governo federal quer fazer política, que pague. Mas só aqui no Estado hoje, se o governo federal quisesse implementar, daria R$ 6 bilhões. Para todo o Brasil, quase R$ 50 bilhões. O Brasil tem isso? Não tem saúde, não tem educação, não tem estrada, não tem ferrovia. Eu não sou contra os índios, só quero saber se eles têm dinheiro para isso. E está certo tirar gente que trabalha? Pegamos escritura de 1876, de imigrantes alemães, italianos. Os caras compraram as terras deles, não expulsaram ninguém. E era para colonizar, hoje dizemos: “Vai embora daqui”, para gente que nasceu aqui, muitas gerações. Os índios, na época, não sei se havia mil na região do Rio Grande do Sul, hoje tem 23 mil índios. Fraudulentamente eles montaram esse processo. Assim é em Mato Preto (nos municípios de Getúlio Vargas, Erebango e Erechim), e assim é nos 30 processos. Tudo que eles fizeram foi mais ou menos esquematizado. É com isso que não concordo. Quer comprar 100 mil hectares de terra? Se o Estado tem dinheiro, que compre, não tem problema. Mas não faça isso de montar processos fraudulentos.
JC – Isso estimula os conflitos?
Heinze – Lógico, porque foi estimulado, eles traçaram uma estratégia. Agora um laudo anula tudo. E qual é o cara que investe se não tenho segurança jurídica alguma? Dilma fala que o Brasil pode investir, daí vem construir uma hidrelétrica em Belo Monte, onde não tinha índio. Fizeram um levantamento com as pessoas, daí trouxeram índios e colocaram tudo lá em cima. Tudo é montado, o erro esta aí. Não é de terra que eles precisam, é de dar condições para que produzam. Dos 23 mil, são 100 índios. O resto são lideranças deles, não aparecem. Eles também são vítimas desse processo. Eles estimularam 30 processos no Rio Grande do Sul. Tem 23 mil índios, eles criaram essa fantasia. Eles quem? Funai, ONGs. Por que os antropólogos estão aqui? Porque eles arrumaram emprego para eles. Tem mais de mil processos de quilombolas aqui. Mas 90% do pessoal pensam desse jeito: que um laudo vale uma escritura, aí eles fraudam. Qual o lugar em que não há vestígio de índio que posso dizer? Qualquer lugar do Brasil. Um dia alguém morou, tudo bem. Mas só isso não serve.
JC – Como analisa essa suspensão da tramitação da PEC 215, que possibilitaria que o Legislativo seja responsável pela homologação das demarcações, hoje feitas pelo Executivo.
Heinze – Uma das razões é ideologia. No momento em que suspendemos na semana passada, quando teve uma reunião com José Eduardo Cardoso e o procurador-geral da República, se resolveu discutir duas coisas. Eles nos prometeram apresentar um decreto. A (ministra chefe da Casa Civil) Gleisi (Hoffmann, PT) prometeu em abril que colocaria no processo a Embrapa, o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e o MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário). É o que eles vão nos apresentar, uma portaria, um novo rito demarcatório tirando os superpoderes que a Funai tem hoje. A Funai é o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, faz tudo. Daí tem dois, três, cinco anos para fazer um processo, mas a pessoa tem 90 dias para fazer sua defesa. Então, se vê que é um pouco ideológico.
JC – Os críticos da PEC dizem que o Congresso privilegiaria os ruralistas, já que têm mais representação que os indígenas.
Heinze – Se era para delimitar até 1993 e estamos em 2013, até quando vai? Do jeito deles, que não tem que pagar nada, e eles querem 20 milhões a 30 milhões de hectares a mais, vai terminar quando? O que eles dizem é o seguinte: “São 3% do Brasil”. Dá 24 milhões ou 25 milhões de hectares. Já tem 14% em terra indígena.
JC - Como fica a pauta da FPA com a suspensão da análise da PEC?
Heinze - O que priorizamos hoje é a votação do Projeto de Lei 227, que ele trata da regulamentação do artigo 231, que ele coloca isso aqui, que daqui para frente o Estado faça. Pronto. Agora, anula esse processo. “Ah, os processos que já estão andando ficam”. Ficam nada. Tudo que está errado tem que sair daqui. Quero respeitar o marco temporal de 1988. O trâmite está emperrado, porque o governo não quer. E quando ele não quer, não vai. O governo tranca desde abril, maio. Sabe quem pediu pra fazer esse projeto? O Ministério da Justiça, e agora estão emperrando. Na reunião, vamos discutir isso. O negócio é o seguinte: temos que regulamentar esse artigo e só tem um jeito de fazer; basicamente, temos que votar o tal do marco temporal e acabou, não posso deixar, tem mais de 100 famílias com problemas no Brasil. Quantas mortes de índio e de branco teve em cima desse assunto? Não dá. Tem que pôr um fim.
JC – Esse trâmite, na sua avaliação, traz prejuízos para a economia brasileira?
Heinze – Mas é lógico. Esse pessoal planta trigo, soja, tira leite, planta qualquer coisinha ali. No Maranhão, 5 mil pessoas estão para serem expulsas de uma cidadezinha por essa questão indígena. Lá tem dívida do Brasil com a Venezuela, se saem as famílias, terminam a cidade. Está certo isso? A maioria da cidade é de índios, mas porque a lei é assim, tem que fazer.
JC – Por outro lado, as entidades ligadas aos indígenas apontam que muitos processos dos supostos proprietários das terras é que teriam sido fraudados.
Heinze – A Embrapa hoje tem mecanismos que remontam aos anos 1950. Mas vamos pegar a Constituição de 1988. Quem estava em cima da terra em 1988, que foi o marco?
JC – Há denúncias de pressão e agressão para tirar indígenas das terras...
Heinze – Violência tem aqui. Os índios ameaçando os produtores, fizeram isso em Mato Preto, tiraram gente em Sananduva, 7 hectares invadidos. O presidente da associação de lá disse que eles não quiseram enfrentar, tiveram medo.
JC – A FPA diz que há violência dos indígenas, e eles, por sua vez, denunciam violência por parte dos produtores. Há como conciliar essas duas versões?
Heinze – Mas não são duas verdades, a verdade é uma só. O artigo 231 fala em áreas tradicionalmente ocupadas, mas eles começam a desenvolver uma tese que pode ser de quando o Brasil foi descoberto. A verdade é uma só: eles que distorcem a verdade. O que quer dizer a Constituição de 1988 é “quem está ocupando a terra”. O Supremo julgou nesse termo. Espero que mantenham quinta-feira no julgamento dos embargos da Raposa-Serra do Sol (em Roraima).
JC – O senhor afirma que há injustiça no processo. Mas e a reparação histórica aos indígenas? A bancada ruralista é acusada de dar primazia a interesses econômicos.
Heinze – Não é um problema. Não tenho que reparar nada. Por que 7 mil famílias do Rio Grande do Sul têm que pagar? Temos 11 milhões de habitantes, por que 7 mil foram crucificados? Foram escolhidos? Há suicídio, depressão, mortes.
JC – O senhor vê alguma possibilidade de consenso?
Heinze – Negociação. Os laudos têm que ser sepultados. Para mim, são fraudulentos. E o governo tem que comprar os hectares.
JC – Com relação às eleições de 2014, como avalia a conjuntura para o lançamento da candidatura própria do PP com a senadora Ana Amélia Lemos?
Heinze – Tenho falado muito com vereadores, lideranças do PMDB, que têm comentado que gostariam dessa aliança. A gente tem uma ligação muito boa. A ideia mais fixa é eles terem candidato. O que estamos trabalhando hoje é que seria uma chapa ideal se fosse José (Ivo) Sartori com Ana Amélia.
JC – PP ou PMDB estão dispostos a abrir mão da cabeça de chapa?
Heinze – É difícil. Ana já está na posição que está nas pesquisas, que mostraram que ela está lá em cima. O PMDB tem uma condição firme de ter um candidato, e o PDT tem a candidatura do (deputado federal) Vieira (da Cunha), e ele venceu dentro do partido. É importante isso. Eles têm um belo candidato ao Senado, o Lasier (Martins). Mas, em política, nada é impossível.
JC – O PP integrar o governo Dilma Rousseff (PT) atrapalha uma candidatura de oposição ao governo Tarso?
Heinze – Negativo. No Rio Grande do Sul e em outros estados, a gente sempre busca a independência. O partido dificilmente fecha questão de Norte a Sul. Existe gente que quer apoiar Dilma, gente que queria apoiar Eduardo (Campos, PSB) e que quer apoiar Aécio (Neves, PSDB), que é meu caso. Hoje, em função da Ana Amélia, por causa do tempo de TV, muita gente quer vender o tempo, e somos bem claros que isso tem que ser discutido com o partido. Vai ter quem apoie Aécio, mas pode não ser essa a decisão do partido em nível estadual. Tinha o apoio a Campos, que complicou com a Marina, pelas posições que ela tem tomado. Há um ranço com o (deputado federal Ronaldo) Caiado (DEM-GO), há comigo. São as mesmas posições.
Perfil
Luis Carlos Heinze é natural de Candelária. Migrou para Alegrete na adolescência, onde completou o ginásio agrícola, atuando como técnico-agrícola. No município, também participava do grêmio estudantil, onde iniciou sua atividade política, ainda que sem filiação a partido. Já em Santa Maria, nos anos 1970, graduou-se em Agronomia pela UFSM. Na universidade, presidiu o centro acadêmico do curso. Estabeleceu-se em São Borja em 1973, criando um escritório de planejamento e assessoramento a produtores. Ali iniciaria sua ligação com o movimento ruralista, especialmente com os arrozeiros. Foi secretário municipal da Agricultura de São Borja de 1991 até 1992, quando disputou a prefeitura do município. Venceu e comandou o Executivo até 1996. Disputou e conquistou uma cadeira na Câmara dos Deputados no pleito de 1998. Desde então, busca a reeleição, estando no quarto mandato. No ano que vem, pretende concorrer para manter o espaço na Câmara novamente. Tem 63 anos.