FERNANDA DA COSTA | VICENTE DUTRA
TENSÃO NO NORTE
A lentidão do processo de regularização da Terra Indígena Rio dos Índios, em Vicente Dutra, no norte do Estado, motivou um confronto que terminou em agressão, invasão de balneário e incêndio de escritórios comerciais. E o clima entre os envolvidos na disputa fica acirrado a cada dia.
Cansados de esperar pela terra, um grupo de 50 índios invadiu, na noite de quarta-feira, um balneário de águas termais que fica dentro da área demarcada como indígena. No total, a terra Rio dos Índios tem 715 hectares. Já o complexo turístico Termas Minerais Águas do Prado ocupa cerca de 25 hectares e tem 196 cabanas construídas, que recebem perto de 20 mil visitantes por ano. No local, também residem famílias proprietárias de cabanas. Quando chegaram à área, os indígenas entraram em confronto com o vigia do estabelecimento.
Altair dos Santos Bueno, 48 anos, conta que, por volta das 19h, um dos veículos dos índios teria colidido com um carro estacionado em frente ao balneário, o que o motivou a deixar a guarita onde trabalhava. O vice-cacique Luis Salvador afirma que, quando os índios chegaram ao pórtico de entrada, o vigia os recebeu a tiros, o que teria motivado a briga.
Depois deste incidente, no final da tarde de ontem, um grupo organizado por proprietários de cabanas na área invadida resolveu retomar o local. Com pedaços de madeira e pedras nas mãos, os moradores enfrentaram os índios, que recuaram. Segundo a Brigada Militar, os indígenas retornaram para a área onde residem. Eles moram há 20 anos em dois hectares ao lado do balneário.
Depois do confronto com o vigia do complexo, na noite de quarta-feira, os índios atearam fogo ao escritório administrativo do complexo, onde também funciona um escritório de advocacia. Todos os documentos dos dois escritórios foram perdidos, além de móveis e aparelhos eletrônicos.
– Não temos mais como recuperar as ações que ainda não foram encaminhadas à Justiça. O que eu vou dizer às pessoas que estão com ações de aposentadoria, por exemplo? – questiona o advogado Osmar José da Silva Júnior.
Para mediar o conflito entre índios e agricultores, a Fundação Nacional do Índio (Funai) marcou reunião com os índios, que deve ocorrer às 14h de hoje, no Ministério Público Federal em Passo Fundo. A agressão ao vigia deve ser investigada pela Polícia Federal.
ENTREVISTA
“Ele veio para cima dos índios atirando”
Depois de passar mais de 10 anos esperando pela regularização de área indígena, o vice-cacique Luis Salvador, 44 anos, afirma que o grupo protestou para pressionar o governo, mas que não queria que o ato terminasse em conflito.
Zero Hora – Por que vocês resolveram invadir o balneário?
Luis Salvador – Nós temos direito de ocupar o espaço, e essa ocupação é para pressionar o governo a agilizar a nossa posse da terra. Estamos morando há 20 anos em área de dois hectares dentro da nossa terra, que tem 715 hectares. Queremos pressa na indenização dos agricultores e de quem tem cabanas no balneário. Queremos que o governo dê outras terras para os agricultores e essa é a única forma que temos para chamar atenção.
ZH – O que motivou o grupo a entrar em confronto com o vigia?
Salvador – Chegamos para ocupar o balneário, e ele veio para cima, atirando. Um dos índios foi ferido com golpe de faca. Outros brancos se envolveram na briga, mas fugiram. O guarda tem rixa antiga com os índios e já tinha nos provocado outras vezes.
ZH – Por que os escritórios foram incendiados?
Salvador – Isso também foi para chamar a atenção. Queremos pressa nas indenizações.
ZH – A atitude acabou prejudicando pessoas com ações judiciais elaboradas pelo escritório jurídico e que não estão envolvidas no conflito.
Salvador – Prejudicou os donos dos escritórios, que estão envolvidos no conflito, sim. Eles não deixam os índios usarem a área do balneário para pegar material para fazer artesanato. Eles não respeitam nosso trabalho.
ENTREVISTA
“Fui agredido com pedras, flechas e facão”
Com ferimentos na cabeça e nas costas e um corte profundo no braço, o vigilante Altair dos Santos Bueno, 48 anos, achou que não teria forças para pedir ajuda. Ele afirma que foi agredido por cerca de 50 índios ao tentar evitar que o balneário de águas termais onde trabalha fosse invadido, em Vicente Dutra. Com muita dor no corpo e dificuldade para falar devido aos dentes quebrados e aos ferimentos na boca, o vigia, que também é agricultor, contou a Zero Hora como ocorreu a agressão.
Zero Hora – Como o conflito começou?
Altair dos Santos Bueno – Os índios chegaram ao balneário pouco depois que eu assumi o serviço, às 19h, e um dos carros deles bateu em outro que estava estacionado. Eu decidi sair da guarita e ir ver o que estava acontecendo. Perguntei para eles o que estavam fazendo e eles disseram que era para eu sair se não iria sobrar para mim. Em seguida, eu fui agredido com pedras, flechas e facão. Levei muitas pedradas nas costas e na cabeça e depois fui ferido com um corte de facão no braço. Achei que não teria forças para pedir ajuda e pensei que se ficasse lá eu iria morrer.
ZH – E como você conseguiu pedir ajuda?
Bueno – Eu acho que um dos vizinhos viu que eu estava apanhando e chamou a Brigada Militar. Quando ouvi a sirene da polícia, senti um alívio. Comecei a correr em direção à viatura para pedir abrigo, mas a dor era tanta que eu achei que não fosse chegar até eles. Os policiais abriram a porta e eu entrei no carro, mas os índios vieram atrás de mim. Eles cercaram o carro e quebraram os espelhos e os vidros da viatura da Brigada Militar. Eu só queria sair dali e ficava dizendo para os policiais andarem logo, mas eles ficaram parados um tempo até os índios saírem. Depois, me levaram para o hospital.
ZH – Qual o motivo para que eles agredissem o senhor?
Bueno – Acho que foi porque sou vigilante do balneário e também agricultor. Tenho uma propriedade de 37 hectares nas terras que eles querem.
ENTENDA O CONFLITO
DISPUTA EM VICENTE DUTRA
- A área já declarada como indígena Rio dos Índios tem 715 hectares em Vicente Dutra, no norte do Estado.
- Dentro da área, há um balneário de águas termais, que ocupa 25 hectares. O local, com 196 cabanas, recebe 20 mil visitantes por ano e abriga oito famílias, que residem no local.
- Além do balneário, a área abrange pequenas propriedades rurais.
- Conforme o coordenador da Funai em Passo Fundo, Roberto Perin, a área também já foi demarcada e, em 2012, foi feito levantamento fundiário das benfeitorias a serem indenizadas.
- Após as indenizações e a desocupação da área, Perin explica que a terra precisa ser homologada e regularizada para tornar-se oficialmente indígena.
A DISPUTA NO ESTADO
- Em todo o RS, indígenas reivindicam 100 mil hectares em novas áreas e ampliações de propriedades já delimitadas.
- O RS é o Estado que apresenta o maior número de áreas indígenas sujeitas a conflito no país, conforme o Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
- Relatório mostra que 17 dos 96 territórios classificados como em situação de risco ou conflito estão no RS, representando 17,7% do total nacional.
- A tensão em uma das áreas (Sananduva e Cacique Doble), onde índios e agricultores disputam 1,9 mil hectares, motivou a criação de mesa de diálogo com mediação do Ministério da Justiça.
TENSÃO NO NORTE
Agressão e incêndio em conflito agrário. Após novo confronto, Funai marca reunião para tratar de terra indígena
A lentidão do processo de regularização da Terra Indígena Rio dos Índios, em Vicente Dutra, no norte do Estado, motivou um confronto que terminou em agressão, invasão de balneário e incêndio de escritórios comerciais. E o clima entre os envolvidos na disputa fica acirrado a cada dia.
Cansados de esperar pela terra, um grupo de 50 índios invadiu, na noite de quarta-feira, um balneário de águas termais que fica dentro da área demarcada como indígena. No total, a terra Rio dos Índios tem 715 hectares. Já o complexo turístico Termas Minerais Águas do Prado ocupa cerca de 25 hectares e tem 196 cabanas construídas, que recebem perto de 20 mil visitantes por ano. No local, também residem famílias proprietárias de cabanas. Quando chegaram à área, os indígenas entraram em confronto com o vigia do estabelecimento.
Altair dos Santos Bueno, 48 anos, conta que, por volta das 19h, um dos veículos dos índios teria colidido com um carro estacionado em frente ao balneário, o que o motivou a deixar a guarita onde trabalhava. O vice-cacique Luis Salvador afirma que, quando os índios chegaram ao pórtico de entrada, o vigia os recebeu a tiros, o que teria motivado a briga.
Depois deste incidente, no final da tarde de ontem, um grupo organizado por proprietários de cabanas na área invadida resolveu retomar o local. Com pedaços de madeira e pedras nas mãos, os moradores enfrentaram os índios, que recuaram. Segundo a Brigada Militar, os indígenas retornaram para a área onde residem. Eles moram há 20 anos em dois hectares ao lado do balneário.
Depois do confronto com o vigia do complexo, na noite de quarta-feira, os índios atearam fogo ao escritório administrativo do complexo, onde também funciona um escritório de advocacia. Todos os documentos dos dois escritórios foram perdidos, além de móveis e aparelhos eletrônicos.
– Não temos mais como recuperar as ações que ainda não foram encaminhadas à Justiça. O que eu vou dizer às pessoas que estão com ações de aposentadoria, por exemplo? – questiona o advogado Osmar José da Silva Júnior.
Para mediar o conflito entre índios e agricultores, a Fundação Nacional do Índio (Funai) marcou reunião com os índios, que deve ocorrer às 14h de hoje, no Ministério Público Federal em Passo Fundo. A agressão ao vigia deve ser investigada pela Polícia Federal.
ENTREVISTA
“Ele veio para cima dos índios atirando”
Depois de passar mais de 10 anos esperando pela regularização de área indígena, o vice-cacique Luis Salvador, 44 anos, afirma que o grupo protestou para pressionar o governo, mas que não queria que o ato terminasse em conflito.
Zero Hora – Por que vocês resolveram invadir o balneário?
Luis Salvador – Nós temos direito de ocupar o espaço, e essa ocupação é para pressionar o governo a agilizar a nossa posse da terra. Estamos morando há 20 anos em área de dois hectares dentro da nossa terra, que tem 715 hectares. Queremos pressa na indenização dos agricultores e de quem tem cabanas no balneário. Queremos que o governo dê outras terras para os agricultores e essa é a única forma que temos para chamar atenção.
ZH – O que motivou o grupo a entrar em confronto com o vigia?
Salvador – Chegamos para ocupar o balneário, e ele veio para cima, atirando. Um dos índios foi ferido com golpe de faca. Outros brancos se envolveram na briga, mas fugiram. O guarda tem rixa antiga com os índios e já tinha nos provocado outras vezes.
ZH – Por que os escritórios foram incendiados?
Salvador – Isso também foi para chamar a atenção. Queremos pressa nas indenizações.
ZH – A atitude acabou prejudicando pessoas com ações judiciais elaboradas pelo escritório jurídico e que não estão envolvidas no conflito.
Salvador – Prejudicou os donos dos escritórios, que estão envolvidos no conflito, sim. Eles não deixam os índios usarem a área do balneário para pegar material para fazer artesanato. Eles não respeitam nosso trabalho.
ENTREVISTA
“Fui agredido com pedras, flechas e facão”
Com ferimentos na cabeça e nas costas e um corte profundo no braço, o vigilante Altair dos Santos Bueno, 48 anos, achou que não teria forças para pedir ajuda. Ele afirma que foi agredido por cerca de 50 índios ao tentar evitar que o balneário de águas termais onde trabalha fosse invadido, em Vicente Dutra. Com muita dor no corpo e dificuldade para falar devido aos dentes quebrados e aos ferimentos na boca, o vigia, que também é agricultor, contou a Zero Hora como ocorreu a agressão.
Zero Hora – Como o conflito começou?
Altair dos Santos Bueno – Os índios chegaram ao balneário pouco depois que eu assumi o serviço, às 19h, e um dos carros deles bateu em outro que estava estacionado. Eu decidi sair da guarita e ir ver o que estava acontecendo. Perguntei para eles o que estavam fazendo e eles disseram que era para eu sair se não iria sobrar para mim. Em seguida, eu fui agredido com pedras, flechas e facão. Levei muitas pedradas nas costas e na cabeça e depois fui ferido com um corte de facão no braço. Achei que não teria forças para pedir ajuda e pensei que se ficasse lá eu iria morrer.
ZH – E como você conseguiu pedir ajuda?
Bueno – Eu acho que um dos vizinhos viu que eu estava apanhando e chamou a Brigada Militar. Quando ouvi a sirene da polícia, senti um alívio. Comecei a correr em direção à viatura para pedir abrigo, mas a dor era tanta que eu achei que não fosse chegar até eles. Os policiais abriram a porta e eu entrei no carro, mas os índios vieram atrás de mim. Eles cercaram o carro e quebraram os espelhos e os vidros da viatura da Brigada Militar. Eu só queria sair dali e ficava dizendo para os policiais andarem logo, mas eles ficaram parados um tempo até os índios saírem. Depois, me levaram para o hospital.
ZH – Qual o motivo para que eles agredissem o senhor?
Bueno – Acho que foi porque sou vigilante do balneário e também agricultor. Tenho uma propriedade de 37 hectares nas terras que eles querem.
ENTENDA O CONFLITO
DISPUTA EM VICENTE DUTRA
- A área já declarada como indígena Rio dos Índios tem 715 hectares em Vicente Dutra, no norte do Estado.
- Dentro da área, há um balneário de águas termais, que ocupa 25 hectares. O local, com 196 cabanas, recebe 20 mil visitantes por ano e abriga oito famílias, que residem no local.
- Além do balneário, a área abrange pequenas propriedades rurais.
- Conforme o coordenador da Funai em Passo Fundo, Roberto Perin, a área também já foi demarcada e, em 2012, foi feito levantamento fundiário das benfeitorias a serem indenizadas.
- Após as indenizações e a desocupação da área, Perin explica que a terra precisa ser homologada e regularizada para tornar-se oficialmente indígena.
A DISPUTA NO ESTADO
- Em todo o RS, indígenas reivindicam 100 mil hectares em novas áreas e ampliações de propriedades já delimitadas.
- O RS é o Estado que apresenta o maior número de áreas indígenas sujeitas a conflito no país, conforme o Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
- Relatório mostra que 17 dos 96 territórios classificados como em situação de risco ou conflito estão no RS, representando 17,7% do total nacional.
- A tensão em uma das áreas (Sananduva e Cacique Doble), onde índios e agricultores disputam 1,9 mil hectares, motivou a criação de mesa de diálogo com mediação do Ministério da Justiça.